Gastronomia ou Energia, eis a questão!
Durante este meses a minha terra, Vila Nova da Barquinha, promove os sabores do rio e da cozinha típica a eles associada com uma mostra gastronómica que convida a degustar iguarias com tradição secular, a Açorda de Sável e o Arroz de Lampreia, entre outras, e a visitar o maravilhoso, histórico e místico Castelo de Almourol.
Os entendidos avisam que “para prejuízo de todos” “o rio nos dias hoje não tem a mesma abundância” desta “preciosidade gastronómica” que “suscita paixões perpétuas” (cito Armando Fernandes).
As ameaças à sobrevivência destas espécies piscícolas são inúmeras, apesar do seu contributo único para o desenvolvimento regional, e multiplicam-se desde o incumprimento de caudais ambientais que aumenta a eutrofização e limita a oxigenação das águas, a poluição agrícola e industrial, a falta de depuração das águas residuais, o massacre perpetrado por aves marinhas que procuram alimento e refúgio ao longo dos rios (gaivotas e corvos marinhos), algumas após o encerramento das lixeiras onde viviam em verdadeiros ecossistemas, os açudes e as barragens cuja construção secundariza as passagens de peixes que deveriam garantir o trânsito das espécies, para montante e para jusante, a sobrepesca e a utilização de meios de captura ilegais, com a fiscalização debilitada desde a supressão da função de Guarda-rios.
A verdade é que se trata do impacte ambiental negativo dos nossos desequilíbrios sociais sobre os habitats e as espécies que tanto apreciamos e que constituem o nosso património natural e paisagístico, mas cuja vulnerabilidade de conservação tendemos a ignorar até que nos faltem no prato.
Relembro ainda a iminência de várias ameaças ao património natural do rio Tejo que conhecemos, desde a política de transvases em Espanha até às barragens de Almourol e Alvito, sendo que qualquer delas lhe retirará a beleza natural de ser um rio vivo em Portugal e colocará em causa quer a qualidade da água quer o desenvolvimento das espécies piscícolas.
O prejuízo de todos pode vir a agravar-se uma vez que a avaliação da Comissão Europeia sobre o Plano Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico (PNBEPH) concluiu que a lampreia do mar será fatalmente atingida se for construída a Barragem do Almourol, visto que a área a jusante da barragem de Belver é um dos últimos lugares disponíveis para a migração e reprodução da lampreia do mar (cfr. Relatório Arcadis – Avaliação do PNBEPH).
Esta ameaça começa a tornar-se realidade quando o presidente do INAG anuncia novos pretendentes para a concessão da barragem à cota 24, após um concurso deserto por falta de viabilidade económica.
Neste negócio importa clarificar quais as novas contrapartidas que agora garantem a sua viabilidade e saber se os investidores incluíram nas suas contas um investimento de 3,5 milhões de euros para uma escada de peixe, considerando que seja igual à consignada para o açude de Coimbra pela Ministra Ambiente, Dulce Pássaro, no passado dia 19 de Fevereiro.
Se tenho dúvidas quanto ao negócio, mais dúvidas tenho quanto à eficácia das passagens para peixes, sobre as quais as mentes mais esclarecidas concluíram pela existência de diferenças significativas entre a abundância de enguia a jusante e a montante de pequenos aproveitamentos hidroeléctricos (cfr. Ferreira et al. (2000) – Plano de Gestão da Enguia - 2009-2012).
E se querem saber mais, o melhor é perguntarem aos pescadores da Ortiga.
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