quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

A DANÇA DOS TRANSVASES - CRÓNICA "CÁ POR CAUSAS" - JORNAL A BARCA - 28 DE DEZEMBRO DE 2011


Nos últimos 30 anos a política de gestão da água e dos rios em Espanha sustentou-se em grandes obras hidráulicas que retêm a água dos rios em barragens ou a desviam por transvases entre bacias hidrográficas com vista ao favorecimento económico das actividades de agricultura intensiva ou dos empreendimentos imobiliários associados ao turismo.
O fim em si mesmo é a rentabilização económica da água dos rios independentemente da sustentabilidade social, ambiental e, em última instância, económica das actividades que dependem deste recurso.
Através dos transvases geram artificialismos na distribuição geográfica da disponibilidade dos recursos hídricos com impactos relevantes nas bacias cedentes e receptoras, sendo que as primeiras deixam de dispor da água suficiente para as suas actividades económicas e de lazer das populações ribeirinhas, enquanto as segundas prosseguem em ciclos de crescimento vicioso de investimento em actividades que são insustentáveis por se suportarem em recursos que ali não existem.
Apesar desta realidade começar a ser espelhada nos novos planos de gestão das regiões hidrográficas, os políticos mostram-se incapazes de contrariar a pressão dirigida à contínua busca de ganhos imediatos e de conduzirem os seus povos por um caminho que conserve e garanta a disponibilidade deste recurso fundamental e fonte de vida que é a água.
Um forte exemplo disto mesmo é o regresso da dança dos transvases em Espanha.
Depois dos movimentos de cidadania dos anos 70 terem imposto o recuo do transvase previsto para o rio Ebro, que acabou por ser construído na cabeceira do rio Tejo, e do projecto de plano de gestão da bacia do Tejo espanhol demonstrar a insustentabilidade da manutenção do transvase Tejo – Segura, voltam à ribalta os políticos do levante espanhol a pedir transvases do rio Ebro.
Voltam, mas apenas pela iminência de penalizações pelo incumprimento da política europeia da água na bacia do Tejo, em Portugal e Espanha, a qual os técnicos, profissionais e estudiosos reconhecem não aguentar mais pressões dos usos e abusos a que tem sido sujeita.
Voltam, para saciar a sede de um sem número de explorações agrícolas e imobiliárias que se multiplicaram insustentavelmente à custa de recursos hídricos alheios provenientes de outras regiões e se destinariam a mares que banham outros países.
E voltam, embora existam soluções alternativas que permitem obter uma melhoria do bem-estar das suas regiões e países, sendo a dessalinização e o investimento na eficiência hídrica a melhor forma de garantir a água necessária com ganhos para todas as regiões, cedentes e receptoras.
Será tudo uma questão de bom senso e de partilha de benefícios.
Não podem defender que a “água é de todos”, quando não estão dispostos a contribuir para que o bem-estar colectivo das regiões e dos países seja maior que o seu umbigo inchado e a transbordar.
Enquanto cidadão faço votos que os projectos dos novos planos de bacia hidrográfica tracem uma rota no sentido da gestão da água por onde ela flui, uma rota a percorrer ao longo das próximas gerações, mas, principalmente, uma rota que garanta os recursos de que tanto irão necessitar.
As gerações futuras merecem um Tejo vivo e limpo!
Paulo Constantino

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

CRÓNICA DE UM AÇUDE ANUNCIADO - CRÓNICA "CÁ POR CAUSAS" - JORNAL A BARCA - 3 DE NOVEMBRO DE 2011

O contentamento da centena e meia de pessoas que no dia 24 de Setembro partilharam com alegria as águas do rio Zêzere e do rio Tejo a VOGAR CONTRA A INDIFERENÇA prova a importância de termos rios vivos que possam ser vividos e proporcionem os sentimentos de bem-estar e de felicidade que o nosso povo tanto precisa.
A descida também foi educativa com todos os participantes a constatarem “in loco” uma elevada poluição das águas e um insuficiente caudal do rio Tejo e, ao contrário de algumas descidas em que participei no rio Zêzere, durante a paragem no areal ninguém optou por tomar banho no rio.
O rio Zêzere recebe maior atenção com a finalidade de conservar a qualidade das águas que têm como destino as torneiras de muitas cidades, entre as quais Lisboa, mas infelizmente não está livre de ameaças, muito pelo contrário.
Este rio “vivo” que todos os anos atrai milhares de canoístas de todo o país está hoje ameaçado pela adjudicação do Aproveitamento Hidroeléctrico de Martinchel projectado a dois quilómetros a montante da praia fluvial de Constância, a ser incrustado entre esta vila e a barragem do Castelo de Bode com o limite da sua cota na estrada que ruma a Martichel.
A obra projectada inviabilizaria de imediato as descidas de canoa no rio Zêzere, a actividade turística com maior procura na nossa região de que dependem muitas empresas e postos de trabalho, associados à canoagem, ao lazer, à restauração e à hotelaria, entre outras.
Além da substituição das canoas por passeios de gaivotas a pedais, disponíveis em qualquer das muitas albufeiras da região, iriamos sofrer uma grave perda cultural ao submergir do valioso património do estaleiro naval dos templários, recentemente descoberto e ainda por estudar, bem como uma perda ambiental que seria inflectida por esta descontinuidade fluvial que interromperá as rotas migratórias das espécies piscícolas com destino aos rios Zêzere e Nabão, e pelo acentuar da falta de caudais no rio Tejo em consequência da redução do caudal de chegada à foz do rio Zêzere.
Mas as obras hidráulicas no rio Zêzere não ficam por aqui, o projecto de Plano de Gestão da Região Hidrográfica do Tejo prevê ainda “o aproveitamento de Preanes, no concelho de Constância, no rio Zêzere, com uma potência de 3,8 MW foi colocado no quadro de micro aproveitamentos, já que a sua realização está fortemente condicionada pelas características do aproveitamento já concessionado de Martinchel a montante e pelos níveis de cheia excepcional do rio Tejo naquela zona, que periodicamente poderá submergir a central.”
Em termos ambientais teremos um agravamento dos impactos do “grande” açude quando somados aos do “pequeno” açude, quer a montante, ao impedirem completamente a subida do peixe, quer a jusante, diminuindo os caudais que afluem à foz do rio Zêzere no rio Tejo.
E se possível, que tal uma sucessão de charcos até Lisboa, com açudes de fio de água, em vez de um rio vivo e pleno de vida e biodiversidade?
A biodiversidade não pode ser apenas a palavra bonita que serviu para fazer brilhar os iluminados e incendiar as conferências do ano de 2010, devendo antes servir de referência para as decisões que tomamos todos os dias e que influirão na capacidade de mantermos os ecossistemas que nos mantêm vivos.
O Zêzere merece ser um rio vivo e vivido!
Paulo Constantino

terça-feira, 13 de setembro de 2011

UM RIO DE FELICIDADE - CRÓNICA "CÁ POR CAUSAS" - JORNAL A BARCA - 26 DE AGOSTO DE 2011

A felicidade tem vindo a ser considerada como “um estado durável de plenitude, satisfação e equilíbrio físico e psíquico, bem-estar espiritual ou paz interior em que o sofrimento e a inquietude estão ausentes” e que abrange ainda “emoções ou sentimentos que vão desde o contentamento até a alegria intensa ou júbilo”.
Para Rosseau é difícil ver homens felizes, mas vêem-se “muitas vezes corações contentes”, visto que a felicidade se lê no coração enquanto a alegria se lê nos olhos, no porte, no sotaque, no modo de andar, e parece comunicar-se a quem dela se apercebe”, sublimando o doce prazer de “ver um povo entregar-se à alegria num dia festivo, e todos os corações desabrocharem aos raios expansivos do prazer que passa, rápida mas intensamente, através das nuvens da vida”.
As emoções e o contentamento provocado pelo disfrute das águas que percorrem um rio numa corrente com destino de onda e desejo de mar será “fluviofelicidade”, um conceito criado pelo catedrático em Hidrogeologia e fundador da Fundaçao Nova Cultura da Água, Javier Martínez Gil, que tem tido muita aceitação entre os entusiastas dos desportos de aventura nos rios.
Este conceito pretende transmitir o prazer proporcionado pelo contacto com o meio fluvial, podendo sentir-se deslizando numa canoa pelas águas de um rio ou observando um pato que brinque às escondidas nos caniçais.
A teoria da “fluviofelicidade” defende que os rios geram “bem-estar e sentimentos de felicidade nas pessoas, sendo fontes de emoções e símbolos da vida, fertilidade, nascimento e renovação, fortemente arreigados na nossa cultura e fruto da interiorização de uma ligação especial entre o ser humano e a água que flui”.
A beleza dos rios gera bondade e transmite-nos a tranquilidade, o sossego e a liberdade de que necessitamos para alcançarmos a nossa própria felicidade interior, bem ilustrada na redenção e libertação que o Siddhartha de Hermann Hess alcança como barqueiro de um grande rio que tudo e todos percorrem, ao longo da vida e por todas as eternidades.
Defende ainda a valorização dos rios como património cultural e de identidade, sendo a sua defesa vital para as cidades e povoações situadas nas suas margens, que tendem a perder a sua personalidade quando os rios se degradam ou são desvirtuados os seus leitos.
A visão de um rio contaminado ou degradado transtorna-nos e traz-nos à consciência o vandalismo que nos rodeia, sendo um espelho de uma destruição que provoca défices de beleza que as experiências de “fluviofelicidade” podem ajudar a devolver ao proporcionarem o contacto com o melhor dos nossos rios.
Esta concepção assenta numa nova cultura da água e da vida que aponta os rios como a alma do território cuja destruição extingue a ligação do homem com o seu território.
A actividade VOGAR CONTRA A INDIFERENÇA, a realizar no próximo dia 24 de Setembro pelo protejo – Movimento Pelo Tejo, propõem-vos isto mesmo, uma descida de canoa de Constância a Vila Nova da Barquinha que será simultaneamente um tributo à conservação e à vivência da alegria festiva da “fluviofelicidade” no nosso rio Tejo.
E você está pronto para ser “fluviofeliz”?
Participe, o Tejo merece!
Paulo Constantino

quinta-feira, 21 de julho de 2011

TEJO MEIO CHEIO, MEIO VAZIO - CRÓNICA "CÁ POR CAUSAS" - JORNAL A BARCA - 21 DE JULHO DE 2011

O projecto de Plano de Gestão da Região Hidrográfica, apresentado no passado dia 13 de Julho, representa um passo positivo na afirmação de um planeamento e gestão da água que passa a focar-se na adopção de medidas para alcançar um bom estado ecológico das massas de água dos rios e afluentes do Tejo.
“Bom estado” das águas? E ainda por cima, “ecológico”?
Apesar dos serviços sociais e económicos da água (uso doméstico, irrigação, energia, transporte, lazer e turismo, identidade cultural) serem mais perceptíveis pelo utilizador, os serviços ecológicos (manutenção da qualidade da água, controlo do caudal, estabilização do clima, biodiversidade, protecção dos campos de cultivo) são mais críticos para a sustentabilidade global.
Esta nova abordagem, alicerçada na política europeia da água com a aplicação na Directiva Quadro da Água, afirma que a sustentabilidade da provisão das funções ecológicas, sociais e económicas da água depende da capacidade de assegurar um bom estado ecológico, ou seja, um bom estado de conservação das massas de água e dos ecossistemas aquáticos.
Os novos planos significam uma brisa de esperança na desoladora “secura” a que o Tejo tem sido votado pela primazia absoluta dos interesses políticos, económicos e financeiros em detrimento dos objectivos ambientais.
Uma brisa soprada num apelo de realismo que, não se limitando a ver o copo meio cheio ou meio vazio, pretende encher um pouco mais o copo com as medidas possíveis num contexto de escassez de recursos financeiros.
Antes de tudo, a primeira medida para encher o copo será impedir que o Tejo seja bebido de um trago num qualquer bar aberto do Levante espanhol.
A verdade é que olhamos pela janela e vemos o rio Tejo cada vez com menor caudal após um ciclo de dois anos de precipitações abundantes que permitiram um armazenamento de água na bacia do Tejo em Espanha muito superior ao registado na última década.
O mau estado do rio Tejo, regulado por barragens desde a cabeceira até Abrantes, é atestado pela classificação de 7º rio europeu com maior nível de sobre exploração (índice WISE da Agência Europeia do Ambiente), fundamentalmente em resultado das pressões exercidas pela exploração agrícola e hidroeléctrica.
Este diagnóstico agrava-se quando o índice que avalia as pressões provocadas pelos usos domésticos, industriais e agrícolas sobre os recursos hídricos derivados do subsolo, dos rios e da precipitação anual coloca Portugal como o terceiro país europeu em situação mais vulnerável, com um maior risco para a região de Lisboa e Vale do Tejo, e ocupando a 45ª posição a nível internacional.
É ainda previsível que estas pressões venham a ser acentuadas pelas alterações climáticas e pelo aumento do risco de secas e inundações, tendo o Comité das Regiões apontado a necessidade da governação a vários níveis para a gestão das regiões hidrográficas, envolvendo os poderes europeus, nacionais, regionais e locais, bem como uma perspectiva transfronteiriça, a definição de objectivos precisos de eficiência ao nível das regiões hidrográficas por sector de actividade, a utilização eficiente da água e o alargamento do Pacto de Autarcas de modo a incluir a utilização sustentável da água.
Estes conselhos e o facto das perdas de água ascenderem a 35% do consumo de água deveriam ser motivação suficiente para as autarquias promoverem o uso eficiente da água, quer divulgando as boas práticas de utilização, de que é exemplo o Município de Arcos de Valdevez (http://uea.cmav.pt), quer implementando sistemas de gestão eficiente da água de que é pioneiro o Município de Sousel.
Lago das Tágides 4
Se todos contribuirmos talvez as belas Tágides regressem ao Tejo cavalgando as suas águas nos dorsos dos golfinhos, voltando a inspirar as odes dos nossos poetas.
O Tejo merece!
Paulo Constantino

quinta-feira, 5 de maio de 2011

A CIDADANIA ACTIVA NA GESTÃO DA ÁGUA DO TEJO - - CRÓNICA "CÁ POR CAUSAS" - JORNAL A BARCA - 5 DE MAIO DE 2011

As V Jornadas “Por Um Tejo Vivo” serão realizadas em Portugal pela primeira vez, de 14 a 15 de Maio de 2011 com o apoio do município de Azambuja, acolhendo como participantes os representantes de mais de 100 organizações de cidadãos e associações ambientalistas de Espanha e Portugal, reunidas na Rede de Cidadania por Uma Nova Cultura da Água no Tejo/Tajo.
Encontramo-nos num momento crucial para o futuro do Tejo e seus afluentes uma vez que em Junho de 2011 serão divulgados e colocados à participação pública os Planos de Gestão da Região Hidrográfica do Tejo, em Portugal e em Espanha, que contêm as orientações de gestão e utilização da bacia do Tejo.
Estes planos incluem temas chave como o regime de caudais ambientais, os objectivos quanto ao estado ecológico das águas, as procuras em cada subsistem da bacia em função dos usos identificados, as medidas para alcançar os objectivos estabelecidos, em especial, o bom estado ecológico das águas da bacia do Tejo a alcançar até 2015, nos termos da Directiva Quadro da Água.
A participação pública no processo de elaboração do Plano de Gestão da Região Hidrográfica do Tejo deve concretizar-se pela informação, consulta e envolvimento activo dos interessados na decisão, assegurando a transparência do processo de decisão e o envolvimento dos cidadãos na tomada de decisão acerca dos temas que o possam afectar.
O acesso e divulgação da informação são condições essenciais para uma participação activa e eficaz do cidadão, que tendo abertura de diálogo e esclarecimento antecipado por parte das autoridades competentes deverá também assumir a sua quota-parte de responsabilidade na melhoria da decisão tomada.
Infelizmente os processos de participação pública nos novos planos de bacia têm sido insuficientes e têm vindo a intensificar-se as pressões para a manutenção dos transvases da bacia do Tejo para a bacia do Segura e Guadiana, assim como para a concretização de novos transvases desde a Estremadura, no Médio Tejo espanhol, que condicionam a gestão do rio.
Em boa verdade, antes da Páscoa, o Ministério do Ambiente, Assuntos Rurais e Marinhos de Espanha ordenou à Confederação Hidrográfica do Tejo o cancelamento do debate sobre caudais ambientais na bacia hidrográfica do Tejo, que esta tinha agendado no âmbito do processo de participação pública, devido à pressão do Sindicato de Regantes do Aqueduto Tejo Segura (SCRATS), que classificou esta iniciativa como de “ousadia”.
A Universidade de Madrid e a Fundação Nova Cultura da Água conjugaram esforços e organizaram o primeiro debate público sobre caudais ambientais na bacia do Tejo, na mesma data e com os mesmos oradores, resistindo a estas pressões políticas e aos interesses económicos que querem retirar aos cidadãos e utilizadores da água da bacia do Tejo a oportunidade de discutir, identificar problemas e em conjunto encontrarem soluções para os muitos desafios que a recuperação do bom estado ecológico dos rios da bacia do Tejo coloca.
De igual modo, estas Jornadas apresentam-se como uma oportunidade única para que cidadãos e associações da bacia do Tejo analisem conjuntamente os novos Planos de Gestão da Região Hidrográfica, avaliando a forma como abordam os problemas que afectam o rio e os seus afluentes, e elaborem propostas sólidas de alternativas de gestão que permitam a recuperação do rio e dos seus territórios.
E mais importante, permitirão informar, preparar e incentivar os cidadãos e associações da bacia do Tejo a intervirem activamente na participação pública vertendo o conhecimento de largos anos de experiência e vivência do rio Tejo ou de qualquer dos seus rios, ribeiro ou riachos, em contributos concretos de melhoria das propostas de planeamento e gestão da água que venham a ser apresentadas pela administração.
A verdadeira cidadania activa faz-se participando e contribuindo para fazer melhor.
O TEJO MERECE A NOSSA PARTICIPAÇÃO!

quinta-feira, 24 de março de 2011

POR UM TEJO VIVO E NÃO RADIOACTIVO - CRÓNICA "CÁ POR CAUSAS" - JORNAL A BARCA - 24 DE MARÇO DE 2010

Na Europa encontram-se em funcionamento um terço das centrais nucleares do mundo (149 - 34%), que produzem uma equivalente proporção da geração da energia eléctrica neste continente (38%) e da produção de energia nuclear mundial (38%), predominantemente localizadas na França, Reino Unido e Alemanha.
O acidente de Fukushima, Japão, veio relembrar que os perigos da energia nuclear na Europa e na península ibérica com diversas organizações portuguesas e espanholas a reclamarem mais uma vez o encerramento de todas as centrais nucleares em Espanha (10 reactores nucleares), que foram construídas apesar das fortes mobilizações antinucleares.
A 15 de Março de 1976, Portugal disse não ao Nuclear em Ferrel, no concelho de Peniche, localidade situada numa zona de sismicidade elevada, graças à população que se insurgiu contra a construção de uma central nuclear na sua terra.
As águas do rio Tejo servem os sistemas de refrigeração das centrais nucleares espanholas de Trillo, através da barragem de La Ermita, e de Almaraz, na albufeira de Arrocampo.
A central nuclear José Cabrera até 2006 também se refrigerava com as suas águas na barragem de Zorita, tendo sido encerrada após 38 anos de actividade.
A central nuclear de Almaraz descarrega as águas de refrigeração dos seus dois reactores no rio Tejo, aumentando a radioactividade artificial do seu leito de acordo com o Instituto Tecnológico e Nuclear, apenas a sete quilómetros do Parque Nacional de Monfrague e a cento e dez quilómetros do Parque Nacional do Tejo Internacional, em território português, locais onde se alimentam as cegonhas negras, as águias imperiais e os abutres negros.
Em Outubro de 2010, realizou-se uma Conferência Internacional de Risco Tecnológico Nuclear que incidiu sobre um cenário de terramoto na zona de Almaraz aportando riscos de acidente nuclear e de inundação que adviria do rebentamento da barragem de Vadecañas e do consequente galgamento da Barragem de Cedilho, provocando inundações desde Vila Velha de Rodão até à Barragem do Fratel, tendo ficado por saber se as barragens de Fratel e Belver aguentariam tais cargas.
Um eventual acidente nuclear levaria a um aumento da contaminação radiológica do rio Tejo entre as barragens do Alto Tejo português cujos efeitos se estenderiam até Lisboa visto que a água e o ar são os melhores condutores de radiação e o rio corre sempre na mesma direcção, para a foz.
Apenas seria possível garantir as medidas de protecção básicas à população como permanecer dentro dos edifícios, fechar todas as portas e janelas, desligar ventilações e lavar com água e sabão as vítimas contaminadas com radioactividade visto que o exército apenas dispunha de material de descontaminação para os seus elementos, motivo pelo qual o simulacro realizado em Novembro apenas testou a resposta da protecção civil aos riscos de inundação.
A inquietação que provoca esta insuficiência de meios de intervenção aumenta devido a outras lacunas, desde a ausência de planos de emergência para as várias cidades e regiões afectadas, apenas elaborados para a região de Castelo Branco, a escassa coordenação entre os organismos responsáveis e até à falta de informação dos cidadãos sobre estes riscos.
A Central de Almaraz iniciou o seu funcionamento em Outubro de 1981 tendo a mesma antiguidade que as centrais recentemente encerradas na Alemanha para avaliar a sua segurança e ponderar a sua continuidade em funcionamento.
Ao invés, o governo espanhol afirmou de forma peremptória que "as centrais em Espanha são seguras" mas "anunciou que vai ser realizada uma revisão dos sistemas em vigor, especialmente para lidar com cenários de catástrofes naturais".
O governo português afirmou que "Portugal estará, pelo menos, tão preparado como o Japão", enquanto o responsável do Comando Distrital de Operações de Socorro de Portalegre afirmou que "uma eventual explosão na central nuclear de Almaraz obrigaria à “progressiva” retirada da população da zona de Portalegre" e que outro passo “seria desenvolver um plano de descontaminação junto das pessoas e das águas do rio Tejo".
Afinal as centrais nucleares espanholas são ou não são seguras?
Existem ou não existem planos de emergência e meios de descontaminação?
Será este o momento de investir seriamente na investigação de energia alternativas e sem riscos para o bem-estar ambiental e humano?
Será que a lamentável tragédia do Japão é suficiente para a consciência de que a energia nuclear não é solução?
A única forma de garantir a segurança das populações é dizer não ao nuclear e optar por energias verdadeiramente limpas e seguras.
Por um Tejo sem radioactividade!
Paulo Constantino

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

A ÁGUA DE UM RIO É O ESPELHO DO HOMEM? - CRÓNICA "CÁ POR CAUSAS" - 17 DE FEVEREIRO DE 2010

O filósofo Ludwig Fewrback afirmou que “a água é o primeiro espelho do homem” no sentido de que reflecte a identidade e a verdade da acção do homem sobre a natureza.
Alguns defensores da água vão mais longe questionando a sustentabilidade do nosso modo de vida e do tratamento das águas do planeta ao afirmarem “se um rio é como um espelho que reflecte os valores e comportamentos da nossa sociedade, a nossa não vale o que bebe nem o que come, valendo talvez o que produz de sujidade, lixo e poluição...” (Dom Luiz Flávio Cappio - Bispo da Diocese de Barra, Bahia).
À semelhança de Narciso, o Homem rejeitou a paixão da ninfa Eco e foi amaldiçoado a apaixonar-se incontrolavelmente pelo consumo exagerado e desregrado que não sendo capaz de satisfazer em harmonia com a natureza por certo o conduzirá ao suicídio por exaustão dos solos, da floresta e da água, pela desertificação do planeta. O próprio slogan “salvar o planeta” denota uma cegueira de quem não assume que tem de agir para salvar a própria vida e a biodiversidade que nele habita.
Na verdade, a degradação do ar, floresta, solo e água irá prejudicar a qualidade destes recursos no futuro e conduzir a uma menor produtividade das diversas actividades económicas que destes dependem, que actualmente mantém práticas e níveis de produção insustentáveis face aos recursos disponíveis.
Quanto aos recursos hídricos, aos rios, ribeiras e aquíferos, o seu estado ecológico tem vindo a ser prejudicado por factores de diversa ordem, como sejam:
a) a menor capacidade de retenção da água nos solos devido à plantação de vegetação que facilita a evaporação (ex: eucalipto) em substituição de vegetação autóctone (ex: carvalho) que a dificultava;
b) a degradação da qualidade da água decorrente do insuficiente tratamento das águas residuais do consumo humano, da poluição produzida pelo excesso de fertilizantes químicos utilizados na agricultura intensiva, pelas descargas ilegais da indústria agro-alimentar e da pecuária, com especial responsabilidade das suiniculturas, e pelo aumento do número de barragens;
c) o esgotamento de aquíferos e a escassez de águas subterrâneas decorrente da sobre - exploração dos recursos hídricos pelo agricultura de regadio;
d) a redução dos caudais dos rios que são alimentados pelos aquíferos, desviados através de transvases para a irrigação de outras bacias e retidos por barragens que alteram o ciclo hidrológico e favorecem a evaporação;
e) a diminuição dos caudais que permite a subida da água do mar face ao recuo da água doce e a progressão da salinização dos solos com a consequente redução da superfície de terras disponíveis para a agricultura.
Os maltratos a que o rio Tejo está actualmente sujeito é um bom exemplo da cegueira e do desequilíbrio na exploração dos recursos hídricos, sendo também um espelho que reflecte a degradação dos seus afluentes.
O rio Tejo tem visto os seus caudais diminuídos até à secura devido à retenção de água nas barragens e ao seu desvio por transvases, enquanto os seus afluentes lhe têm vindo a transmitir uma acentuada carga de poluição gerada pelas descargas de efluentes das suiniculturas e da indústria agro-alimentar no rio Maior, de químicos da indústria dos curtumes no rio Alviela, de fertilizantes químicos excessivamente usados na agricultura intensiva, da indústria de óleos e de álcool no rio Almonda e das águas residuais de consumo humano (esgotos domésticos) sem adequado tratamento na ribeira de Santa Catarina, como em tantos outros dos afluentes da sua bacia.
E vocês? Já olharam bem para os rios, ribeiras e riachos da vossa terra?
Acham que o Tejo os merece?
Paulo Constantino

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

A PESCA E A GASTRONOMIA TRADICIONAL EM RISCO DE DESAPARECEREM DO TEJO

A notícia de hoje no Jornal Público "Estudo alerta que poluição no rio Tejo ameaça pesca e gastronomia regional" - Lusa 28.12.2010 - Ecosfera - Público alerta para o facto da "gastronomia regional, com base no peixe do rio Tejo, pode estar em risco dado que a poluição, o assoreamento e as barragens ameaçam a sustentabilidade da pesca e a viabilidade das espécies do Tejo”, com base num estudo desenvolvido pela Universidade de Aveiro.
Seguem-se nos diversos jornais as notícias de alerta, de que devemos destacar também “Sável: Uma delícia em risco de desaparecer” por JOANA CAPUCHO no Diário de Notícias - Ciência de 28 Março 2010, quanto ao facto da poluição, do assoreamento e das barragens conduzirem à degradação ecológica do rio Tejo e estarem a ameaçar a sustentabilidade da pesca tradicional e a viabilidade das espécies do Tejo colocando em causa a gastronomia regional, que destas faz fabulosos repastos.
É verdade que estes são factores extremamente contundentes para a sustentabilidade da pesca e para a viabilidade das espécies piscícolas, mas a estes podemos juntar outros que nos têm vindo a ser comunicados por pescadores e cidadãos que vivem o rio Tejo todos os dias.
A pesca tradicional está em claro declínio, sendo cada vez mais substituída por barcos de fibra de vidro e motores de combustão a quatro tempos, pelo que de tradicional já tem muito pouco.
Apenas subsistem poucos pescadores assumidos enquanto o número de clandestinos e ocasionais está em franco crescimento, sendo que estes últimos, embora façam uma pesca do género tradicional com redes, normalmente não cumprem os prazos de defeso reprodutivo das espécies nem as distâncias de máximas pescáveis em troços pequenos visto que o objectivo é pescar muito em pouco tempo.
A pesca no período reprodutivo é bastante praticada devido à concentração de peixes nos açudes, o que permite uma pesca rápida e proveitosa, onde a falta de fiscalização, por ausência de meios quer humanos quer materiais, permite que simplesmente fiquem impunes por estas acções.
O desaparecimento de espécies tradicionais, como a boga e o barbo, parecem estar a contribuir para o declínio da pesca tradicional.
As espécies exóticas como o achigã e mais recentemente a lúcio-perca, com mais interesse gastronómico que as espécies tradicionais e/ou económico como o lagostim vermelho, criam de alguma forma um contraponto ao desaparecimento das actividades piscatórias tradicionais.
Além disso, os pescadores de rede têm como objectivo a captura de peixes (alguns constantes no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, com a classificação de “Criticamente em Perigo” ou “Vulnerável”) para mais tarde servirem de isco para as armadilhas de lagostins.
Resumindo, a pesca tradicional já pouco ou nada tem de tradicional, estando em regressão a quantidade de pescadores que praticam esta actividade como forma de subsistência exclusiva.
Em boa parte, os motivos expostos na exposição anterior são também aplicáveis à pesca desportiva que tem vindo a ser desmotivada, designadamente, no Alto Tejo com a interdição de navegação em Cedillo durante seis meses, pelos € 150 para obtenção de um “Parecer” do ICNB, a crescente eutrofização do rio com os habituais cenários de infestações de micro algas e cianobactérias e os maus cheiros que afastam facilmente qualquer pescador desportivo.
Esta actividade, que poderia ser catalisadora de actividade económica ligada a uma actividade amiga da Natureza, está em declínio e é evidente a quantidade de pescadores que abandonou definitivamente o rio Tejo como destino de pesca.
Em simultâneo, num grande número de municípios ribeirinhos têm vindo a intensificarem-se os festivais de gastronomia regional do sável e da lampreia que, pelo seu valor económico, são das espécies mais atingidas pela degradação ecológica do rio Tejo e pelos nefastos comportamentos dos pescadores clandestinos e daqueles que não respeitam as regras de conservação das espécies que os sustentam.
Como é que isto é possível no maior rio Português onde as populações sempre viveram do peixe que o rio lhes dava?
Neste contexto consideramos que importa responder a algumas questões que lançamos em desafio a quem quiser contribuir para a sua resposta.
- Seremos capazes de motivar à participação pública das comunidades ribeirinhas nas decisões de desenvolvimento local, nos planos estratégicos e de gestão hidrográfica, garantindo o seu envolvimento na escolha das melhores soluções de desenvolvimento local e de gestão integrada dos recursos hídricos?
Para envolver as populações, as autarquias, as forças vivas da sociedade é necessário que o rio seja também encarado como fonte de proveito que desperte o interesse destas entidades.
Em primeiro lugar, devemos ter água de qualidade e uma gestão piscícola correcta que permita a criação e desenvolvimento de peixes em quantidade e qualidade.
Devem ainda ser criadas infra-estruturas de apoio, cais de atracagem, parques de lazer, junto ou envolvendo o rio, parques de campismo, zonas ribeirinhas com restauração, pistas de pesca.
Por outro lado, infelizmente, o associativismo parece estar em desuso no nosso país, salvo raras excepções, e sem organizações que concentrem a vontade dos interessados sendo mais difícil um envolvimento das populações nas decisões em causa.
- Será possível a existência de comunidades ribeirinhas dinâmicas, preservando activamente o património cultural e ecológico, que permitirá, no futuro, potenciar o desenvolvimento de outras actividades económicas, como o turismo local, de natureza e cultural, actividade em crescimento em toda a Europa?
Será possível se essas comunidades se interessarem pelos valores associados ao rio e os venham a preservar e a potenciar.
No entanto, boa parte das pessoas que lidam diariamente com o rio apenas estão interessadas em retirar o máximo de proveito, muitas vezes sem olhar a meios.
Por exemplo, existem pescadores que tapam frequentemente troços de menor dimensão de um extremo ao outro, impedindo qualquer fuga por parte dos peixes.
Devemos perguntarmo-nos se fazem isto por falta de peixe, que os leva a tomar medidas drásticas, ou apenas pela ganância de apanhar mais.
Assim, independentemente dos objectivos prejudicam a preservação das espécies piscícolas.
Serão estas pessoas, com este tipo de comportamento, que darão origem a comunidades que preservem e potenciem o desenvolvimento de actividades ligadas ao rio?
Por outro lado, a população do rio desapareceu quase toda tendo optado pelo trabalho a horas certas com salário certo ao fim do mês em detrimento de um trabalho com poucas garantias e limitações em períodos de invernada, que não permitia a pesca e logo, o sustento.
- Será possível definir e implementar um projecto de preservação das comunidades ribeirinhas do Tejo, dos seus recursos culturais e ecológicos que congregue os esforços da administração, dos agentes económicos e culturais, e dos cidadãos da borda de água?
Temos ainda que nos questionar se ainda existem comunidades ribeirinhas visto que as populações ribeirinhas, apesar de estarem junto ao rio, não mantêm com a água qualquer actividade constante.
A preservação das comunidades ribeirinhas apenas será possível com a recuperação e recriação de actividades que liguem de forma constante e permanente as populações ribeirinhas ao rio, visto que actualmente existem apenas alguns pescadores tradicionais, com idade já avançada, mas cuja quantidade se encontra em franco declínio.
O Tejo merece esta reflexão!

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A ÁGUA DE TODOS EM PROVEITO DE ALGUNS - CRÓNICA "CÁ POR CAUSAS" - JORNAL "A BARCA" - 9 DE DEZEMBRO DE 2010

Os nossos rios são uma riqueza natural imensa que a indústria dos tempos modernos se habituou a transformar numa grande riqueza material cuja ganância faz esquecer a sua função natural no ciclo da água, ou seja, conduzir a água no seu leito até ao mar assegurando no seu curso o transporte de sedimentos até à foz, a sustentabilidade da vida nos ecossistemas aquáticos, a conservação dos habitats de espécies piscícolas, com forte presença na gastronomia das populações ribeirinhas, a recarga do abastecimento dos aquíferos e a qualidade das águas dos nossos rios.
A perda da qualidade da água obriga ao aumento dos custos que suportamos com o seu tratamento e impede que as populações ribeirinhas possam disfrutar dos seus tempos de lazer a banharem-se nos rios como fizeram alguns de nós, os nossos pais e os nossos avós.
Isto acontece fundamentalmente para garantir o engrossar dos lucros da agricultura intensiva que não compensa a sociedade pela contaminação da água com fertilizantes e nutrientes e das hidroeléctricas que ganham com os nossos rios muito mais do que poderá valer o seu contributo para a diminuição da dependência energética e a contrapartida que pagam ao Estado pela concessão dos seus caudais.
Um artigo publicado em Outubro pelo jornal “El País” (*) afirma que as hidroeléctricas em Espanha pagam entre 10 e 20 milhões de euros por ano ao Governo espanhol pelo caudal dos rios, um bem público, que transformam em energia pela qual fazem os consumidores pagar 1.000 milhões de euros por ano.
Estes lucros são apelidados pelos especialistas e pelas entidades reguladoras de “lucros extraordinários” ou de “lucros caídos do céu” (windfall profits) face à sua enormidade que advém de um preço de mercado excessivo face a um custo de produção minimalista que não reflecte os custos sociais e ambientais.
Na verdade, os consumidores pagam a electricidade produzida pelas hidroeléctricas ao preço da fonte de energia mais cara fixado por um sistema de preços onde os produtores oferecem em função da procura existente
A energia nuclear é a primeira a ser fornecida, seguida de todas as energias renováveis e da energia hidroeléctrica, sendo completado o que falta com as energias mais caras, o carvão e o gás.
O preço mais caro, do gás, é aquele que será cobrado por todas a fontes de energia permitindo assim ganhos extraordinários às fontes de energia mais baratas, como é o caso da hidroeléctrica.
De acordo com o “El País” a “Comissão Nacional de Energia advertiu para o efeito perverso do sistema em 2008” e fontes do Governo espanhol afirmaram a esse jornal que as hidroeléctricas "Não pagam pela água. Os montantes que pagam de compensações são mínimos”, tendo sido iniciado um processo de revisão das tarifas sobre as barragens concessionadas que está limitado pelo facto da primeira grande concessão apenas expirar em 2024.
Além disso, os custos de produção para o consumidor não deveriam incorporar a depreciação económica das barragens construídas visto que as receitas auferidas pela sua concessão já compensaram o pagamento das obras.
Ao invés, as hidroeléctricas deveriam pagar ao Estado a compensação económica pelos danos ambientais em termos de qualidade da água e de degradação dos ecossistemas aquáticos, em especial, os causados às espécies piscícolas.
Apesar do artigo referir a realidade de Espanha esta é totalmente aplicável a Portugal visto que em 2004 foi instituído o Mercado Ibérico da Electricidade (Mibel), que definiu um plano de convergência tarifária e a criação de um mecanismo harmonizado de aquisição de energia pelos comercializadores de último recurso ou distribuidores.
Assim, percebe-se facilmente a origem dos enormes lucros que a EDP tem vindo a acumular ano após ano nos seus relatórios anuais.
Seria desejável que o Governo português informasse as populações ribeirinhas, que têm vindo a ser prejudicadas pela falta de caudais no rio Tejo, sobre quais os montantes que a EDP paga pela sua utilização, qual o lucro “extraordinário” que tem vindo a acumular à custa da água do rio Tejo e quanto tem investido em medidas de conservação ambiental, como sejam, as escadas de peixe e a reabilitação de rios e ribeiras.
As recentes notícias de instalação de um aproveitamento hidroeléctrico no açude de Abrantes fazem-me voltar à pergunta sem resposta que já coloquei no Conselho da Região Hidrográfica do Tejo: no estudo de viabilidade deste aproveitamento hidroeléctrico foi considerado o custo da construção de uma verdadeira passagem para peixes?
Esperemos que os lucros “extraordinários” que daí advierem comportem este investimento ou que seja pago o que é justo pela utilização dos caudais do rio Tejo de modo a diminuir as tarifas que todos os consumidores pagam pela energia em Portugal.
Pessoalmente optava claramente pela primeira alternativa!
O Tejo merece!
Paulo Constantino

(*) “El gran negocio privado con el agua de todos Jornal” – Jornal “El País” - 10/09/2010 – Rafael Mendez

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

ESPANHA RESTRINGE CAUDAIS AMBIENTAIS EM PORTUGAL AOS MÍNIMOS PREVISTO NA CONVENÇÃO DE ALBUFEIRA

O Governo Espanhol restringe os caudais ambientais para Portugal em Cedilho aos mínimos previstos na Convenção de Albufeira conforme documento de enquadramento prévio à elaboração do projecto do novo Plano de Gestão da Região Hidrográfica do Tejo espanhol - “Questões Significativas da Gestão da Água do Tejo” (QSIGA) espanholas - aprovado no passado dia 3 de Novembro de 2010 pelo Conselho Executivo da Confederação Hidrográfica do Tejo (CHT).
A Confederação Hidrográfica do Tejo afirma que está em curso um estudo detalhado dos caudais ambientais em cada troço do rio Tejo e subscreve que as afluências destinadas a Portugal serão determinadas de modo a que os caudais ambientais em Cedilho não excedam os limites mínimos previstos na Convenção de Albufeira, bem como irá restringir os índices de seca da Convenção de Albufeira aos previstos no Plano Especial de Seca, conforme afirmado a páginas 38 da “Proposta de Relatório do Organismo da Bacia sobre as propostas, observações e sugestões apresentadas às Questões Significativas da Gestão da Água do Tejo (QSIGA)”.
Esta entidade não faz mais do que cumprir zelosamente as indicações constantes dos comentários da IBERDROLA – EMPRESA HIDROELÉCTRICA ESPANHOLA, a qual “exige” que “na definição dos caudais ambientais em Cedilho, deve procurar-se que não sejam superiores ao acordado na recente revisão da Convenção de Albufeira.” – Vide páginas 93 e seguintes da Proposta de Relatório do Organismo da Bacia sobre as propostas, observações e sugestões apresentadas às Questões Significativas da Gestão da Água do Tejo (QSIGA)”.
Confirmam apenas aquilo que já sabíamos:
1º. Os caudais mínimos ecológicos negociados pelas autoridades portuguesas na Convenção de Albufeira restringem-se aqueles que são aceites pelas empresas hidroeléctricas espanholas, sendo que os caudais semanais e trimestrais ali previstos são desprezíveis visto que a serem cumpridos representam apenas 20% do caudal anual previsto como já referimos aqui;
2º. A bacia do Tejo em Portugal vai continuar a sofrer pela sobre - exploração que a agricultura intensiva (regadio) e as hidroeléctricas exercem sobre a água do Tejo em Espanha;
3º. A regularização de caudais e as pressões associadas à utilização de água na parte espanhola afectarão o curso principal do rio Tejo com a alteração do regime de escoamento e dos parâmetros de qualidade, confirmando as “Afluências de Espanha”, as “Águas enriquecidas por nitratos” e a “Eutrofização” como as principais pressões sobre a gestão da água do Tejo em Portugal de acordo com o previsto nas “Questões Significativas da Gestão da Água do Tejo (QSIGA)” em Portugal aprovadas em Agosto de 2009
Esta posição do Governo espanhol é inadmissível e, como já expressámos aqui, continuaremos a defender que a mudança necessária no modelo de gestão do Tejo requer o planeamento de soluções viáveis para as pressões de que padece o rio e a reivindicar, em conjunto com as associações que constituem a Rede de Cidadania por uma Nova Cultura da Água no Tejo/Tajo e seus afluentes, que o novo Plano de Gestão da Região Hidrográfica do Tejo em Portugal e Espanha contemple as seguintes medidas:
1º. Estabelecimento de um regime de caudais ambientais para os rios da bacia do Tejo com base em critérios científicos, independentes e comprováveis, e o começo do processo de concertação que facilite um debate plural e informado que permita alcançar os objectivos de bom estado ecológico que estabelece a Directiva Quadro da Água (DQA);
2º. Recusar a política de transvases, incluindo os transvases existentes e previstos, por considerar que devem implementar-se alternativas aos transvases baseadas no uso eficiente e gestão da procura de água nas bacias receptoras, recorrendo preferencialmente a medidas não estruturais, com a finalidade de promover a substituição progressiva dos transvases por outras fontes de abastecimento.
3º. Exigir a revisão do Convénio de Albufeira para adaptá-lo às exigências da DQA. Em concreto:
a) Supressão da reserva de 1.000 hm3 para transvases do Tejo prevista no Convénio, visto que não existem esses excedentes na bacia hidrográfica do Tejo.
b) Requerer a revisão do regime de caudais definido no Convénio dentro do processo de planeamento em curso para a gestão da região hidrográfica do Tejo, o qual deverá ser submetido a uma participação pública activa, a reforçar nos planos de gestão da região hidrográfica do Tejo, de acordo com a DQA, dado que se trata de um elemento estrutural desses planos.
Se nos projectos de plano de gestão da região hidrográfica do Tejo prevalecer a visão minimalista e hidroeléctrica de gestão de caudais iremos reivindicar caudais ambientais no cumprimento da DQA “até que a garganta nos doa”, apresentar uma queixa à Comissão Europeia e solicitar que esta promova a realização de um estudo de avaliação do impacte ambiental estratégico da política de transvases em Espanha, conforme definido na Carta Reivindicativa Ibérica em Defesa do Tejo, e se necessário, como bem afirma Miguel Angél Sanchez, recorrer aos tribunais de justiça de Espanha, Portugal e Europeu face a uma clara violação do direito internacional.
Convidamos todos os cidadãos da bacia do Tejo em Portugal a subscreverem as alegações da Rede de Cidadania por uma Nova Cultura da Água no Tejo/Tajo e seus afluentes (Rede do Tejo) sobre esta inaceitável proposta de “Questões Significativas da Gestão da Água do Tejo” (QSIGA) espanholas, que devem enviar para participa.plan@chtajo.es.
Participem, manifestem a vossa opinião e deixem-lhes estes comentarios.
O Tejo merece!!

Deixamo-vos ainda as notícias em Espanha que veiculam as apreciações de 3 entidades sobre as Questões Significativas da Gestão da Água do Tejo (QSIGA) aprovadas no passado dia 3 de Novembro de 2010 pelo Conselho Executivo da Confederação Hidrográfica do Tejo:
Da Plataforma em Defesa do Tejo e do Alberche de Talavera de la Reina
ABC.ES
Talavera de la Reina (Toledo), 4 Nov (EFE) - O porta-voz da Plataforma em Defesa do Tejo e Alberche de Talavera, Miguel Angel Sanchez disse que as Questões Significativas da Gestão da Água (QSIGA) da demarcação do Tejo, o documento de base para o futuro plano de hidrológico da bacia deste rio "é para atirar ao lixo."
Em declarações à EFE, Sanchez pediu para "atirarem ao lixo" as Questões Significativas da Gestão da Água (QSIGA) que aprovou ontem o Conselho Executivo da Confederação Hidrográfica do Tejo (CHT), uma vez na sua opinião trata-se de "um documento pobre que é um insulto".
Segundo Sanchez, o documento "passou pela rama tudo o que dizem os técnicos" e nem sequer acolhe as alegações de plataforma nem de grande parte das organizações que alegaram.
As Questões Significativas da Gestão da Água (QSIGA) funciona como "um catálogo das principais questões a ter em conta para definir a gestão do Tejo", explicou Sanchez, que foi surpreendido com o facto não reflectir que "o Tejo está seco no seu troço médio", porque "a água está a esgotar-se" e que nem se refira o Transvase Tejo-Segura.
"É como um doente de cancro a quem não tratam nem a doença nem atacam a raiz do tumor", afirmou.
Nesse sentido, definiu todo o processo de elaboração do plano hidrológico da bacia do Tejo como "uma grande mentira" e como "um trabalho mal amanhado e incompleto" que de momento não aponta soluções alternativas a uma “gestão aberrante do rio".
Advertiu que existem "muitos interesses políticos em torno do Tejo" e que há muitos responsáveis políticos "a favor dos transvases" e disse que a presidente do CHT, Mercedes Gómez - como aconteceu com o seu antecessor, "é um fantoche nas mãos do Secretário de Estado ou do Ministério", onde "ninguém se atreve a fechar a torneira do transvase."
Sanchez espera pelo documento fundamental, o projecto do plano de gestão da bacia hidrográfica, que terá um período de seis meses para alegações.
É quando "vamos usar toda a artilharia, coordenando esforços com as organizações portuguesas", adiantou Sanchez, que prevê que "teremos que ir aos tribunais, aos de Espanha, Portugal e Bruxelas, ante uma clara violação do direito internacional".
Pediu ao Município de Talavera para "manter a sua atitude combativa e lutadora” e denunciou que à cidade de Toledo a CHT "está a tapar-lhe a boca com dinheiro."
Do Município de Talavera de la Reina
O alcaide de Talavera de la Reina não dá a sua concordância às Questões Significativas da Gestão da Água do Tejo (QSIGA)
TALAVERA de la Reina (Toledo), 04 de novembro (Europa Press)
O alcaide de Talavera de la Reina (Toledo), José Francisco Rivas, disse que não pode aprovar o documento que foi discutido na reunião desta quarta-feira na Confederação Hidrográfica do Tejo (CHT) pelo Comité das Autoridades de Bacia da Hidrográfica, no qual se abordaram as Questões Significativas da Gestão da Água (QSIGA), um documento sobre o qual se traçaram as linhas do futuro plano de hidrológico do rio.
Rivas participou nessa reunião em representação da Federação Espanhola de Municípios e Províncias de Castilla-La Mancha e alcaide de Talavera e assinalou que os rios Tejo e Alberche "não estão para tantas imprecisões."
A este respeito, sublinhou numa conferência de imprensa que a sua posição é de não se conformar com estas Questões Significativas da Gestão da Água (QSIGA), visto que “é um documento tão denso e extenso como irreal e não define, não concretiza e não lista os problemas que sofrem os dois rios."
Rivas sustem que “não resolve os problemas nem oferece soluções, tudo é muito genérico e em alguns aspectos, um brinde ao sol." "Nem em representação do meu povo posso dizer sim a um documento prévio à elaboração do Plano Hidrológico da Bacia, que não considera prioritário como salvar o Tejo", precisou.
Na sua opinião, a referência ao que sucederá com o transvase Tejo-Segura deveria ser "algo importante e fazer parte destas Questões Significativas, mas não há nenhuma menção a este, nem às reservas de água que do ponto de social e ambiental, deve existir nas barragens da cabeceira nem sequer explicita o que são as massas de água tanto em qualidade como em qualidade, nem os pontos de monitorização."
Segundo Rivas, "continuam a cair no mesmo erro e por isso vamos dar-lhes luta, porque não se entende que neste documento se apontem soluções mínimas de mudança."
O regedor talaverano disse categoricamente que "irá empenhar-se" na defesa do rio, mas com especial ênfase na área de Talavera de la Reina.
Da Junta das Comunidades de Castilla-La Mancha
TOLEDO, 04 de novembro (Europa Press)
O Conselheiro do Ordenamento do Território e Habitação do Governo Regional de Castilha –La Mancha, Julian Sanchez Pingarrón, prezou que as Questões Significativas da Gestão da Água (QSIGA) do Plano de Bacia do Rio Tejo reconheça que as contribuições da precipitação anual nas barragens da cabeceira se situem em cerca de 700 hectómetros, e que há um caudal suficiente para permitir que os ecossistemas do rio possam manter-se, e haja reservas de hídricas.
Falando à imprensa no Parlamento, o conselheiro referiu-se desta forma ao conteúdo da reunião do Conselho Executivo da Confederação Hidrográfica do Tejo, na qual se analisou as Questões Significativas da Gestão da Água (QSIGA) do Plano Hidrológico do Tejo, reunião na qual o governo regional deixou claro que esta será a sua escolha.
Assim Pingarrón explicou que neste momento se permite transvasar até 600 hectómetros, uma abordagem que se baseia no facto das barragens da cabeceira recolherem cerca de 3.000 hectómetros cúbicos de água por ano. "Mas o plano diz que isto foi analisado e que essa quantidade está em cerca de 700 hectómetros, e se se quiser manter o abastecimento e o caudal ambiental restam muito poucos recursos que são aqueles que se podem transvasar."
É por isso que tem insistido que a exigência de Castilha - La Mancha será a de manutenção dos caudais ambientais, mas sem especificar um número, porque faz parte da negociação do plano. "Deve haver um caudal suficiente para que todos os ecossistemas fluviais sejam mantidos, para garantir a vida do rio, e que haja reservas para os aqueles que estão associados às barragens da cabeceira".
O conselheiro explicou que, embora este documento não seja limitador do planeamento, inclui assuntos e prioridades devem incluir-se no plano hidrológico, assuntos que mais tarde serão parte do projecto do plano, que virá a informação pública antes da sua aprovação final.
Segundo Sanchez Pingarrón, as Questões Significativas que foram discutidas na quarta-feira inclui avanços significativos sobre a posição de Castilha - La Mancha, na definição e prioridade do rio Tejo, bem como a revisão das regras de exploração do aqueduto Tejo - Segura, que consideram absolutamente obsoletas e já não se podem manter por mais tempo".
Pingarrón defendeu estas posições, que não são "viáveis" nestes momento, exigem que o futuro plano regule e estabeleça os caudais ambientais, que é outra das reivindicações do Governo de Castilla-La Mancha para garantir que o caudal do rio Tejo tenha bastante os suficientes metros cúbicos por segundo e se fale de uma reserva da bacia.
"Por parte de Castilla-La Mancha, vamos continuar a exigir que os avanços se vão concretizando e se consiga mais, que o plano garanta todos os usos da bacia", disse o conselheiro, que insistiu que o plano deve assegurar uma reserva suficiente de água nas barragens da cabeceira para usos actuais e futuros.
"Esse espelho de água deve permitir as utilizações recreativas ou turísticas nos municípios ribeirinhos. Nos comentários afirmámos a nossa satisfação pelos progressos realizados, mas também a necessidade de continuar trabalhando", insistiu o conselheiro.